A saúde mental continua a ganhar destaque nas discussões sobre bem-estar e políticas públicas no Brasil. Dois estudos recentes oferecem um retrato atualizado e preocupante: um deles analisou a prevalência de transtornos mentais e o uso de serviços de saúde mental em Ribeirão Preto, enquanto outro avaliou tendências de internações psiquiátricas no Sistema Único de Saúde (SUS) entre 2012 e 2023. Juntos, eles revelam desafios importantes para o país — desde a necessidade de ampliar o acesso a tratamento até a urgência de estratégias preventivas mais eficazes.
Prevalência elevada e desigualdades sociais
O estudo conduzido em Ribeirão Preto avaliou duas faixas etárias da população: jovens adultos (22-23 anos) e adultos na casa dos 37-38 anos. Os resultados mostraram que uma parcela significativa apresentava algum transtorno mental diagnosticável, incluindo depressão, ansiedade, transtorno bipolar e transtornos relacionados ao uso de substâncias. Além disso, os dados indicaram que fatores como nível socioeconômico, escolaridade e gênero influenciam tanto a prevalência quanto a busca por tratamento.
Por exemplo, indivíduos em situações socioeconômicas mais vulneráveis apresentaram maior risco de desenvolver transtornos mentais, mas tinham menor probabilidade de procurar ajuda especializada. Essa disparidade ressalta o peso das desigualdades sociais na saúde mental brasileira e aponta para a necessidade de políticas públicas que garantam acesso equitativo a serviços de qualidade.
Principais Transtornos Mentais no Brasil
- Depressão Maior – Uma das condições mais comuns, associada a humor deprimido persistente, perda de interesse e sintomas físicos como fadiga.
- Transtornos de Ansiedade
- Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG)
- Transtorno de Pânico
- Fobias específicas e fobia social
- Transtorno Bipolar – Episódios alternados de mania/hipomania e depressão, impactando significativamente o funcionamento diário.
- Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias
- Dependência de álcool
- Dependência de outras drogas (cocaína, crack, opioides, etc.)
- Transtornos Psicóticos
- Esquizofrenia
- Outros transtornos esquizoafetivos ou delirantes
- Transtornos de Personalidade – Como o borderline (TPB) e o antissocial, que causam padrões persistentes de comportamento e dificuldades de relacionamento.
- Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) – Frequentemente associado a violência urbana, acidentes e traumas.
- Transtornos Alimentares
- Anorexia nervosa
- Bulimia nervosa
- Transtorno da compulsão alimentar periódica
- Transtornos Neurodesenvolvimentais (em crianças e adolescentes)
- Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH)
- Transtorno do Espectro Autista (TEA)
Uso limitado dos serviços de saúde mental
Outro dado preocupante do levantamento é o baixo uso dos serviços de saúde mental. Mesmo entre pessoas diagnosticadas com algum transtorno, muitas não haviam recebido acompanhamento médico ou psicológico nos últimos 12 meses. As razões para isso são diversas: falta de informação, estigma associado aos transtornos psiquiátricos, barreiras financeiras e dificuldades de acesso a profissionais especializados pelo SUS.
A situação é particularmente grave para jovens adultos, grupo em que os transtornos mentais frequentemente surgem pela primeira vez. O atraso no diagnóstico e no início do tratamento pode levar ao agravamento do quadro clínico, maior risco de automedicação e dificuldades na vida profissional e pessoal.
Internações psiquiátricas em transformação
Um segundo estudo, que analisou dados de internações psiquiátricas pelo SUS ao longo de 11 anos (2012-2023), mostra mudanças significativas no perfil dessas hospitalizações. Em algumas faixas etárias e tipos de transtorno, as internações diminuíram possivelmente refletindo o fortalecimento da atenção psicossocial e dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Por outro lado, houve aumento em casos relacionados ao uso de substâncias e em determinados transtornos graves, especialmente entre homens jovens.
Esses números sugerem que, embora haja esforços para priorizar o cuidado comunitário e reduzir a dependência de internações, ainda existem lacunas importantes, principalmente na prevenção e no acompanhamento de casos mais complexos. A sobrecarga dos serviços ambulatoriais e a falta de profissionais especializados continuam sendo obstáculos.
O que os dados significam para o futuro da saúde mental
Os resultados dessas pesquisas reforçam um ponto já conhecido, mas ainda não plenamente enfrentado: a saúde mental no Brasil precisa de atenção prioritária e investimentos consistentes. Políticas públicas devem focar em ampliar o acesso aos serviços, combater o estigma e promover campanhas educativas que incentivem a busca por ajuda. Além disso, é fundamental fortalecer a rede de atenção psicossocial e garantir formação adequada de profissionais de saúde mental para atender à demanda crescente.
Outro ponto crucial é a necessidade de estratégias de prevenção que considerem determinantes sociais, como pobreza, violência e exclusão social, que impactam fortemente o risco de transtornos mentais. Intervenções em escolas, comunidades e locais de trabalho podem ajudar a identificar sinais precoces e oferecer suporte antes que os quadros se agravem.
Conclusão
As novas pesquisas oferecem um retrato claro: os transtornos mentais são comuns entre brasileiros, mas muitos ainda enfrentam barreiras para receber o tratamento de que precisam. Melhorar o acesso, reduzir desigualdades e investir em prevenção são passos essenciais para mudar esse cenário. Com dados concretos em mãos, gestores públicos, profissionais de saúde e a sociedade têm a oportunidade de repensar estratégias e construir um futuro mais saudável e inclusivo para todos.
